Professor de física ajuda a motivar alunos de todo o país através de vídeos na internetLeitura de 13 minutos

Tendências em educação 15 de agosto de 2017

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Professor de física ajuda a motivar alunos de todo o país através de vídeos na internetLeitura de 13 minutos

Com o tema “você sabe física, só  não sabe que sabe” o professor cearense, Idelfranio Moreira, é um dos participantes do Youtube EDU e com seu canal, Física Marginal, o professor disponibiliza conteúdos de forma descontraída e de alta qualidade para motivar e engajar alunos de todos os lugares do país.

 

E hoje você conhecerá um pouco mais sobre o projeto “Física Marginal”, como o professor consegue aliar as tecnologias a educação e motiva os alunos dentro e fora da sala de aula.  

 

Confira a entrevista:

 

Como surgiu o interesse pela profissão?

 

A física apareceu para mim quando eu tinha 12 anos, assistindo um seriado chamado MacGyver ou “Profissão Perigo”, onde o protagonista era um agente secreto que combatia o crime, justamente, utilizando seus conhecimentos científicos, e eu queria ser igual a ele. Eu tinha 12 anos e eu não sabia muito bem o que era aquilo que ele fazia, a única coisa que eu sabia era que chegava mais próximo das coisas que eu via na aula de ciências.

 

Eu tinha uma prima que na época fazia o ensino médio, e ela me disse que aquilo era física. Ela disse: “isso aí é o que hoje você tem como aula de ciências e quando você chegar no ensino médio vai ser separado em física, química e biologia, o que o MacGyver faz é física.” Foi aí eu que pensei: “Pois é isso aí que quero fazer.”

 

Então, eu comecei a estudar de forma autodidata os livros dela do ensino médio, sendo que eu ainda estava na sétima série. E muito cedo, com essa coisa de querer ensinar tudo que aprendia, eu descobri que as pessoas odiavam física. A coisa que eu descobri que era a minha vida era odiada por todos, e a minha prima foi a primeira a dizer que eu ia detestar física, porque era a pior matéria que ela tinha na escola.

 

Quando eu comecei a ler os livros e depois ver as aulas, eu comecei a achar que o erro estava no jeito que as pessoas falavam as coisas. Eu sempre fui contador de história, era algo que tava na veia e eu pensei que se começasse a contar história as pessoas iriam enxergar que a física era uma coisa que todo mundo usava, e isso ficou evidente para mim desde cedo. A pessoa que tava na escola e dizia que odiava física, ela usava a física o tempo inteiro, até para caminhar. Então, isso pra mim era muito contraditório, eu queria ensinar e mostrar as pessoas que física era legal pra caramba, e foi assim que, inevitavelmente, eu virei professor de física.

imagem do MacGyver

Como surgiu a ideia do Física Marginal e de onde saiu essa iniciativa?

 

Bom, veio uma convergência de coisas. De repente veio a internet que me dava a possibilidade de ter acesso à vídeos, veio a banda larga, o streaming, os arquivos com maior compressão. Assim, a vinda da internet banda larga com a possibilidade do uso de vídeos se encaixou com a ideia do enem, anos atrás em 98 ou 2000, não falo o enem quanto avaliação, mas com a proposta de trazer um ensino contextualizado, que ao invés de trazer uma prova que vai cobrar conteúdo, vai cobrar habilidade e competência, foi aí que eu pensei: “Pronto! Era tudo que eu queria.”

 

Então, a ideia de física marginal, vem de três coisas: primeiro que a física sempre foi tratada como uma matéria marginal, porque é a matéria que, em tese, ninguém gosta e quando alguém na sala gosta, ele é considerado o estranho. Esse é o maluco que gosta de física, mas esse é também o que vai pro ITA, IME ou para uma olimpíada.

 

Eu chamei de marginal porque eu  mesmo sou autodidata, eu sempre trabalhei preparando aluno para turma de medicina, para olimpíada, turmas especiais e isso me coloca um pouco a margem. Um dia eu sonhei que tava escrevendo um livro, mas era um livro em que as folhas eram brancas e eu só escrevia nas margens, é como se as páginas todas já tivessem dito tudo que era pra ser dito e eu quisesse acrescentar a minha experiência nas margens. Foi uma viagem meio maluca, mas foi a partir disso que surgiu a física marginal, e o nosso slogan é: “Você sabe física, só não sabe que sabe”.

 

Desse modo, eu busco exemplos e maneiras de mostrar as pessoas que elas sabem física. Eu falo para o aluno que está estudando na escola, eu falo para as pessoas que já são profissionais e não estão pensando em prova, eu falo para professores, futuros professores e para o público comum. Então, hoje a gente faz esse trabalho de levar física para todo mundo com esse viés: você sabe física, só não sabe que sabe.

 

Então eu fiquei convencido que mostrar que a física é uma matéria tão importante como todas as outras, seria uma maneira de contribuir, de fato, para a solução de problemas nacionais.

 

E foi aí que a ficha caiu e eu passei a entender que eu tinha que ter uma ideia mais profissional da física marginal, eu acho que isso pra mim foi um ponto de virada, deixou de ser aquela coisa lá do menino de 12 anos que só queria dizer pra todo mundo que a física era legal e passou a ser uma missão de verdade.

logo do youtube edu - física marginal

Fale um pouco sobre a sua participação no projeto Youtube EDU

 

A minha ideia a princípio era escrever, então bem no começo, o projeto da Física Marginal  na internet era um blog, eu cheguei a ter sete blogs simultâneos com aspectos diferentes da física, até eu ter destreza e entender a importância nos vídeos e criar um canal no Youtube, e logo quando o canal começou, o mote da coisa era sempre esse: uma parte resolver questões para ajudar os alunos que estavam estudando para prova e em outra parte produzir vídeos com essa ideia do você sabe física, só não sabe que sabe.

 

Então, logo em seguida a Fundação Lemann foi convocada pelo Youtube Brasil e pela Google Brasil, para fazer curadoria dos vídeos com aquela premissa: as melhores vídeos aulas em língua portuguesa para criar um portal que fosse funcional para os alunos estudarem através de videoaula. Daí, eu me inscrevi para curadoria. Eram 4 fases, durante 4 meses. Depois da aprovação do Youtube Edu eu tive a oportunidade de conversar com algumas pessoas responsáveis pelo processo e tive a comprovação de que o que colocou a gente dentro do projeto foi exatamente isso, ter um pé dentro da escola atual e o outro adiante, tentando puxar as pessoas para uma visão mais ampla.

 

 

Como é o engajamento dos alunos com a plataforma?

 

O primeiro semestre é quando estamos com uma maior capacidade de produção de conteúdo, então diariamente a produzimos conteúdos de mecânica a eletricidade. Todo conteúdo que o aluno precisa na escola, a gente cria hashtag para conseguir acompanhar, por exemplo, #SegundadaMecânica, #TerçadaTermologia, #QuartadaÓtica, #QuintadaOndulação e #SextadaEletricidade. Então, se ele busca essas hashtags em qualquer rede social ou no Google ele consegue encontrar todos os conteúdos como se fosse um curso completo de física, separado por dia da semana. Além disso, ele pode organizar o estudo dele até baseado nisso.

 

Então, a gente tem podcast, um material com áudio, eu mantenho também um blog em um jornal online, onde eu comento e resolvo questões, e a gente tem vídeos aulas diárias no Youtube, isso tudo levado para as redes sociais, tem também postagem no Instagram, Facebook, Twitter e eu ainda inventei de manter um grupo no Whatsapp. A gente usa diariamente o Whatsapp, não é? Mas a história de grupo me angustia, porque um grupo de 3 pessoas já é improdutivo. Afinal, em algum momento alguém vai dizer alguma coisa que não tem nada a ver com o tema do grupo e fica improdutivo, mas desde que o Whatsapp criou a lista de transmissão eu vi que a coisa iria ficar funcional para mim.

 

Desde 2015 eu mantenho umas doze ou treze listas de transmissões, porque só cabem 256 pessoas em cada lista, e eu já tenho quase 3 mil pessoas cadastradas no país inteiro, onde essas pessoas recebem três vezes por dia todo o conteúdo que produzo e elas podem mandar sugestões e dúvidas que elas tenham, daí eu recebo isso tudo e vou anotando para virar pauta da semana seguinte.

 

Eu não tenho um canal com milhões de assinantes, mas o engajamento do canal é muito grande, não estou fazendo a promessa de deixar a física mais fácil e nem garanto aprovação, a gente faz uma pegada contrária, que é ter aquele aluno que está estudando pra valer. Por exemplo, fiz algumas apresentações ao vivo na sexta-feira à noite e no domingo pela manhã, ninguém acreditou que teria alguém assistindo por conta dos horários escolhidos, mas acabou que o pessoal tava lá, então é algo que me deixa muito satisfeito.

 

 

Em sala de aula, como  você faz para motivar os alunos?

 

Em sala de aula, eu trabalho em uma escola tradicional, em pré-vestibular e todas as aulas elas tem a presença de vídeos online, quer seja os meus, em outras línguas ou de outros professores, isso é uma ferramenta que abriu muitas possibilidades para nós. Veja só, eu faço trabalho de pré-vestibular, e em tese, esse aluno tá interessado em uma coisa: “me faça passar na prova do final do ano”, só que, hoje, a gente tem uma prova, seja o enem ou qualquer outra que propõe ser contextualizada e ser baseada em habilidades e competências e isso me permite levar o mundo para dentro da sala de aula.Hoje eu consigo ter a interatividade, a transdisciplinaridade, o experimental do laboratório, o cotidiano, tudo isso através da internet, e eu não abro mão de utilizá-la em sala de aula, ela é uma ferramenta indispensável”.

 

Certo dia, eu estava dando aula em uma turma de cursinho e resolvendo questões de termodinâmica, no livro tinha uma questão que falava de uma cafeteira que funcionava com diferença de pressão e um aluno levanta o braço e diz: “como eu vou resolver essa questão se eu nunca vi essa cafeteira? Eu não consegui nem entender como ela funciona”. Então, eu fui pro Youtube e achei um vídeo que era do fabricante da cafeteira mostrando como funcionava, inclusive, dando a explicação da diferença de pressão, como se fosse um professor de física falando. Então, ali você consegue tirar a dúvida, efetivamente, você consegue ilustrar a aula, você consegue trazer um contexto para dentro da educação, usando uma linguagem que os meninos entendem.

 

“Então, hoje eu estou muito satisfeito em saber que consigo usar a internet como ferramenta, mesmo fazendo uma aula “tradicional” preparando para vestibular”.

 

Como o uso das novas tecnologias auxilia no processo de aprendizagem dos alunos?

 

O fato de você atender de uma maneira mais personalizada, no ritmo de cada aluno, se a gente parar pra pensar todas essas tecnologias que já comentamos aqui, um vídeo postado no youtube, a possibilidade de acessar a internet na sala de aula, você manter uma lista, não só com seus alunos, mas olha só que maluquice, eu falo todos os dias com mais de 3 mil alunos no país inteiro, eu sozinho, não é uma empresa, não é uma equipe, sou eu sozinho do meu celular.

 

Então, é o vídeo, o texto, você poder fazer questões interativas, é uma espécie de adaptação ao ritmo de cada um, essas coisas todas hoje elas estão tão integradas ao cotidiano da gente que você consegue suprir todas as necessidades que a educação tem, dentro e fora da sala de aula, a coisa se misturou, se fundiu. Hoje, de fato, o aluno tem acesso a informação e ao profissional e eu acho que a grande revolução é essa, é permitir o acesso a informação, a integração de várias plataformas, a comunicação de vários alunos, de vários lugares, e o acesso ao professor, acho que isso é tudo hoje.

 

“Ah, outra coisa importantíssima e fundamental, é o que você faz com a tecnologia. O grande desafio é você, como professor, conseguir entender a tecnologia e saber usar essa tecnologia pedagogicamente, é criar conteúdos significativos, que funcione na plataforma que você quer usar. Uma coisa é um conteúdo pro Youtube, outra coisa é o Instagram, outra coisa é o Podcast. É uma maluquice, mas é legal demais”.

 

O que você diria para os professores sobre a inovação e o motivação com os alunos?

 

Não faz sentido que as pessoas não gostem de uma matéria que é tão legal, tão importante e que de fato pode mudar muita coisa e que eu achava que tudo aquilo dependia de como ela era ensinada e o porque ela era ensinada, então houve um momento que eu achei que era eu que tinha que resolver tudo só. E depois de um tempo, eu entendi que o barato é que os professores e os futuros professores era uma responsabilidade de todo mundo.

 

Então, hoje a gente tá vivendo uma fase bem legal de trabalho, a gente faz oficina, palestras, faz trabalhos com os futuros professores de física e levando sempre essa mensagem de que a gente precisa contextualizar, é preciso que a aprendizagem faça algum sentido, não é cálculo, física não é cálculo, a física é aquela coisa que todo mundo sabe.

 

Um exemplo que eu sempre dou é que se você sabe soprar o seu café, então você sabe transformação adiabática, mas aí você pensa: “que maluquice, eu não sei nem dizer essa palavra” “Ok, mas você sabe soprar o seu café, ótimo! Isso já é o suficiente”.

 

Então, a partir daí você faz uma transformação, e é isso que a gente tenta passar para os nossos professores, e como eu disse, sem abrir mão do uso das tecnologias.  

 

É produzir bons conteúdos para integrar aos alunos e a tecnologia é o fundamento para isso, até porque os meninos estão com a tecnologia na mão tempo inteiro, eles não querem nem olhar pro livro, mas se tiver no celular, eles estão topando tudo, inclusive, física.

 

Outra coisa, grande parte do meu trabalho é convocar as pessoas para serem professores, eu sempre digo isso em sala de aula: “sejam professores!”. É um orgulho tão grande que para homenagear os professores e também convocar os novatos nós criamos um trabalho chamado “Quase 24h de física”, que é um evento ao vivo, usando a internet, onde eu fico 23 horas, 56 minutos e 04 segundos, por isso se chama quase 24h, fazendo um aulão gigante, conversando com outros professores de diversos estados do país, sobre física e educação. E dia 15 de outubro teremos a segunda edição.

 

         
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